domingo, 11 de julho de 2010

Trabalhando em um bom título

Após eu muito insistir, a talentosa Bia Paz (@Kuro_n3ko) escreveu uma fábula para fazer parte da nossa querida casinha.
Então aqui está sua criação.
Hope you guys enjoy it.
xoxo

@JessyMcLovin


"Tempo, tempo mano velho
Falta um tanto ainda eu sei
Pra você correr macio
Tempo, tempo mano velho
(...)
Tempo amigo seja legal
Conto contigo pela madrugada
Só me derrube no final"



Tempo


De que adianta o “era uma vez” se o final não vai ser feliz mesmo? De que adianta toda uma narrativa cheia de floreios se o que na verdade eu quero dizer não é nada bonito?

Essa é a história de um romance que não deveria nunca ter acontecido.


O meu romance.

O romance com o meu Mago do Tempo.

A minha luta contra o relógio e contra o meu próprio metabolismo, contra os meus pelos, odores e sentimentos. Essa história não é a do tipo que vai mudar a sua vida ou te fazer refletir sobre a condição atual do mundo ou da sua vida amorosa, você provavelmente deve estar vivendo o seu sonho encantado com um príncipe que você acha que nunca precisa ir ao banheiro e provavelmente deve achar a vida uma coisa maravilhosa, um espetáculo diário e de graça.

Pense de novo queridinha.

O tempo passa e você vai ficando velha.

Velha e sem graça.

Mas tudo bem, você escolheu por continuar a ler certo? A desgraça de uns é a felicidade e o conforto dos outros não é isso o que dizem? Tudo bem, ria de mim, pode rir. Mas lembre-se:

Um dia você pode estar no meu lugar.

Ele era diferente, ele sabia mudar o tempo, ele era dono do tempo. Podia ir e voltar quando bem quisesse, podia seguir em frente ou retroceder a quantidade de passos e anos que desejasse. Ninguém podia desafiá-lo, ninguém podia derrotá-lo, ele era dono do nosso bem mais precioso. Poderia trazer a nossa glória.

Assim como poderia trazer a nossa ruína.

Ele era o Mago do Tempo, o temível e poderoso Mago do Tempo, não tinha medo de nada e nem de ninguém. Muitos guerreiros tentaram inúmeras vezes vencê-lo, mas quando se tem total controle das horas, um combate de dias vira uma irrelevância de segundos e a vontade de se sair vitorioso de nada importa quando se tem em mãos a manipulação do relógio.

O rei estava desesperado, as damas choravam em agonia, sumiam uma atrás da outra, voltavam velhas, desgastadas, cinzas e grisalhas. A beleza e sensualidade de antes davam lugar a feiúra e isolamento. Os homens praguejavam, o Mago do tempo estava roubando suas filhas, esposas, netas e sobrinhas. Nada conseguia atingí-lo, magias, palavras, espadas, flechas, poções, nada. Nem mesmo a poderosa serra da Lenhadora que odiava o Amor abriu uma ferida em seu corpo e a pobre mulher foi fadada ao esquecimento e solidão eterna.

O Mago ria do terror que causava, e se quisesse repetí-lo era só mover os ponteiros do bonito relógio de bolso que carregava, um relógio feito com o ouro dos deuses e cujas engrenagens continham pedaços dos fios da vida que ele pessoalmente roubara das três parcas que tecem o Destino dos pobres mortais. Um relógio cujos números eram feitos das pedras mais brilhantes e preciosas já encontradas na história dos Imortais, cuja corrente conectava-se diretamente ao trancafiado e solitário coração do Mago.

Ninguém podia tocar naquela corrente feita de veias, sangue e ódio. O Tempo era a única coisa na qual o Mago confiava, o Tempo era o seu único amigo e companheiro, o único que nunca o decepcionou ou o traiu, o Tempo é manipulável, dobrável e pode ser o que o Mago bem quisesse.

Para ele não existia Relatividade.

Não existia limite.

Não existia nada.

Ele era livre.

Livre e sozinho.

Ela sofria com o reinado de terror do Mago, os sorrisos desapareciam conforme os ponteiros trocavam de lugar com os dias e os anos, as pessoas se escondiam e ninguém mais pedia seus conselhos ou palavras, ela estava enfraquecendo junto do resto do reino. A pequena e valente Sabedoria estava morrendo e se não fizesse algo rápido, teria sua existência tirada de si para todo o sempre.

O Mago gargalhava ao ver suas maldades se alastrando pelo agora destruído reino, movia seus ponteiros para ver a desgraça acontecer até que ficasse cansado de tanto rir. A inocente Sabedoria subiu o Monte dos Ventos em busca da Lenhadora mas sua antiga amiga havia caído no esquecimento perdendo-se dentro de si mesma, repetia sempre a mesma frase do mesmo jeito, como se estivesse presa a uma cena horrível.


“Eu não te amo. Eu não te amo. Eu não te amo.
Veja, esculpi nossos nomes numa árvore, os contornei com o formato do coração, o coração que eu dei pra você.”


A Sabedoria chorou ao ver o quão danificada estava sua querida amiga, mesmo não podendo, sentiu raiva e o desejo de se vingar. Aquele Mago sem coração estava matando a todos e não fazia a menor ideia de que aquilo poderia acabar com ele mesmo, o uso do relógio em demasia o exauria cada vez mais, logo se sentiria fraco e cansado.

Logo ele precisaria dormir.

E então o tempo pararia.

E todos ficariam presos até o Mago acordar, presos num sono eterno.

Presos num pesadelo sem fim.

Ela pulou de nuvem em nuvem até alcançar os enormes portões que a separavam dos domínios do terrível Mago, o céu escurecia dando lugar a estrelas brilhantes mas que não tinham vida, eram apenas receptáculos sem luz própria criados para entreter o dono do Relógio quando o mesmo estivesse entediado. Sabedoria abriu caminho por entre pergaminhos antigos e livros novos, caminhou por entre relíquias do passado e descobertas do futuro.

O Mago estava a roubando para si.

Ele estava roubando todo o conhecimento do mundo.

Ele estava roubando a Sabedoria.

Com os olhos cansados e vermelhos ele encarou a invocada oponente com desdém, soltou um riso de deboche, ele tinha o poder de tudo, ele sabia de tudo. Ela de nada poderia fazer contra ele, ele tinha o controle do Tempo, ele possuía do Relógio, sem ele, o mundo não seria nada e sem o Mago, não havia entidade capaz de ordenar e controlar o Tempo.

Isso era o que ele pensava.

A jovem e paciente Sabedoria esperou até que o maldoso vilão notasse sua presença, mas de nada adiantou, ele só se preocupava com o seu mais precioso bem, admirava a corrente feita de veias que pulsava a cada tic-tac, mirava os números e ouvia os fios se embolando nas engrenagens e virando uma coisa só. Ela respirou fundo e desrespeitou um de seus principais fundamentos.

Ela agiu com impulsividade.

E arrancou o Relógio do peito do Mago.

O terrível vilão gritou ao ver o peito sangrando, haviam ferido o seu coração novamente e novamente ele não sabia o motivo, tudo que ele sabia era que doia, doia muito. Uma dor profunda e interminável, o sangue escuro jorrava e a calma Sabedoria observava conforme a corrente antes pulsante perdia seu movimento gradativamente até virar pó.

“Por quê? Por que você fez isso? Ninguém me machuca! Ninguém!” - bradava o Mago ferido no chão segurando o buraco em seu peito.

“E quanto a mim? E quanto a sabedoria que eu espalhei através dos anos e da história? Você acha que não está me machucando a cada furto que comete? A cada semente de medo que implanta nas pobres pessoas desse reino? Quem está matando é você!” - respondeu a jovem com o Relógio em mãos.

“Eu tenho o poder do Tempo! Eu posso fazer o que eu quiser! Se eu não ficar contente posso voltar e deixar as coisas do jeito de antes! Devolva o meu Relógio! Eu preciso dele para viver!” - implorava o agora injuriado Mago, sua voz enfraquecia e os olhos começavam a secar, logo ele viraria a Areia do tempo e voltaria para a Ampulheta.

“Você sempre foi muito sozinho, sempre se machucou por nunca poder ter amigos. Todos eles pertencem ao seu domínio, todos eles ficam velhos e morrem, mas eu não. Eu sou a Sabedoria e eu preciso do Tempo, do mesmo jeito que o Tempo e você precisam de mim” - o Relógio tremia conforme a jovem o colocava na mão de seu dono. A ferida feia e o sangue escuro desapareceram assim como as trevas que residiam no coração do Mago.

“Eu nunca tive um Imortal ao meu lado, perdoe-me eu não vi o que fazia, não tive ciência suficiente para perceber que você é uma parte importante de mim. Peço que não se zangue comigo, prometo consertar as coisas e fazer tudo certo dessa vez” - o Relógio antes dourado era agora branco e o ceu estrelado ganhara a vida que havia perdido, os receptáculos explodiam dando lugar aos pontos de luz que lá pertenciam. O Tempo voltava a fluir como antes.

“Não estou zangada, você ficou cego pelo poder e pela solidão, ninguém merece ficar sozinho por tantas eternidades. Vou ficar do seu lado contanto que nunca deixe de precisar de mim.” - e pela primeira vez o Mago sorriu.

“Te deixo me acompanhar se prometer sempre ser necessária pra mim.” - e então o Morro dos Ventos soprou novamente, a beleza das damas retornara e o esquecimento da Lenhadora foi tão grande que ela não mais odiava o Amor e sim o protegia. Os guerreiros mortos nas batalhas travadas contra o Mago voltaram para suas filhas, sobrinhas, netas e esposas. O rei despertou do seu estado de desespero contínuo e a Sabedoria teve a seus pertences espalhados pela história novamente.


Quando disse que essa história não teria um final bonito eu não menti, eu morri por ele, eu fui tragada por ele, fui violada e furtada. O Mago do Tempo me machucou e me feriu, tanto por dentro quanto por fora.

Não há Sabedoria no mundo que consiga por lógica a um sentimento tão poderoso e letal.

O Amor me matou.

O Amor que eu sinto por ele fez isso.

Me destruiu.

Mas pelo Mago do Tempo eu faria tudo de novo

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